sexta-feira, 16 de julho de 2010

Meu animal é gente!



Não se nasce gente, torna-se gente. “Tenha modos, menina, tome juízo. Não perca a cabeça, seja obediente. Amadureça!”. Crescemos ouvindo conselhos sobre como fazer o nosso animal ser gente. À medida que envelhecemos, somos cada vez menos animal e cada vez mais gente. Aprendemos a domar os instintos, racionalizar os sentimentos.
Um bebê só sente. Chora quando quer comer. Sorri quando sente cócegas. Faz cocô e xixi quando dá vontade. Berra quando sente dor. Já um adulto pode muito bem sorrir quando sente dor. E chorar quando está feliz. Fingir que sente. Ou que não sente. Isso é o que chamam amadurecer. É conseguir esfriar o sangue quando ele esquenta. Engolir o choro e segurar as merdas dentro da gente até o momento apropriado. É ser adequado. É ser agradável. Mesmo quando por dentro nos sentimos um lixo. Será que ser gente é ser menos coerente entre o que sentimos e o que pensamos para atingir um objetivo?

Até que chega um ponto na vida que, de repente, você sente que não se conhece. Você fica confusa. O mantra “seja você” fica martelando na sua cabeça, batendo de frente com o velho “tenha juízo”. Afinal, quem sou eu, o que desejo? Então, você bebe, faz dança de salão para se soltar, aula de ioga para se conectar com o eu interior, terapia para se questionar. Uma busca enlouquecida pelo lado animal, que ficou escondido e só escapa de vez em quando, quando não se quer, te deixando espantada com suas próprias atitudes tão, tão... inadequadas. Você se estranha. E surta porque não aceita que também é animal e a natureza é mais poderosa do que você.

Observo a minha cachorra. Ela fica na dela quando está cansada, mesmo quando eu estou carente e imploro por um carinho. Quando é o contrário, ela, por sua vez, não tem pudores de pedir carinho quando eu estou cansada sem o menor pique para sair do sofá. Não faz nada para me agradar, a não ser quando quer comida. Interesseira? Não, transparente. Ela não blefa, não seduz, não planeja, não tem estratégia. Nela eu confio.

Pois é, as pessoas geralmente amam animais, mas reprimem o seu animal interior e desgostam de quem o escancara. São cavalos, não têm inteligência emocional, descompensados. Mas, afinal, os equilibrados, maduros e espertos, na verdade só são tão gente pra conseguir o que há de mais animalesco – sexo. Sexo como símbolo de carinho, de amor, de recompensa. Como os animais. No fundo, somos todos iguais, seres humanos ou cachorros